Durante o julgamento do chamado “núcleo 4” — grupo acusado pela Procuradoria-Geral da República de promover desinformação sobre as eleições — o ministro Alexandre de Moraes fez duras críticas à atuação de parte da imprensa nacional. Segundo ele, alguns veículos estariam mais preocupados em noticiar a gravata de um ministro ou o terno de outro, do que em discutir o mérito jurídico dos julgamentos em curso.
“Querem transformar o Supremo numa revista Caras”, ironizou Moraes ao se dirigir a Luiz Fux, com quem divergia naquele momento sobre a competência da Primeira Turma para julgar os casos relacionados à suposta tentativa de golpe. “Tiram foto da minha gravata, do terno do ministro Flávio Dino, querem fazer intriga”, reclamou.
A crítica revela um incômodo crescente dentro do STF com a forma como a imprensa tem lidado com os bastidores da Corte. Não é de hoje que ministros são alvos de reportagens mais voltadas para o comportamento, vestimenta ou atitudes pessoais do que para o conteúdo técnico das decisões. Muitos jornalistas e colunistas se tornaram verdadeiros “influenciadores de bastidor”, criando narrativas que, por vezes, distorcem o foco institucional do Supremo Tribunal Federal.
A divergência entre Fux e Moraes também jogou luz sobre um debate relevante: até onde vai o poder da Primeira Turma em casos que envolvem ataques diretos à democracia? Fux defende que decisões de grande impacto nacional devem ser discutidas em plenário, com todos os ministros. Já Moraes argumenta que a Turma tem competência suficiente para julgar o caso do “núcleo 4”, composto por sete acusados de organizar e promover desinformação eleitoral.
É nesse contexto que a imprensa passou a especular sobre um possível atrito entre os dois ministros. Fux tratou de negar qualquer conflito: “O que há aqui não é discórdia, é dissenso”, afirmou, rejeitando os rumores de confronto interno. Para ele, a pluralidade de ideias fortalece o STF, mas não pode ser usada para alimentar manchetes sensacionalistas.
Recentemente, veículos como O Globo e Folha de S. Paulo têm intensificado colunas com foco em detalhes da vida pessoal dos magistrados, transformando os bastidores da Corte em tema de entretenimento. Esse tipo de cobertura levanta uma preocupação legítima sobre o papel da imprensa no fortalecimento institucional e sobre os limites entre liberdade de expressão e responsabilidade jornalística.
Aos olhos da população, que já observa o STF com desconfiança crescente, como apontam pesquisas recentes do PoderData e Paraná Pesquisas, esse tipo de exposição pode minar ainda mais a imagem da Corte. Segundo dados divulgados em abril de 2025, apenas 28% da população confia plenamente no Supremo, enquanto 61% afirmam não se sentir representados por seus ministros.
O episódio desta terça-feira reforça a necessidade de um debate mais profundo sobre a relação entre os Poderes e o papel da mídia em coberturas de alto impacto. Para muitos, a imprensa deveria atuar com mais neutralidade e foco no que realmente interessa: as decisões judiciais que afetam a vida de milhões de brasileiros.
Enquanto a imprensa se ocupa com ternos e gestos, o cidadão comum busca respostas sobre inflação, segurança, saúde e liberdade de expressão — temas que, infelizmente, muitas vezes passam despercebidos nas coberturas que priorizam o espetáculo.
A fala de Alexandre de Moraes, embora polêmica, expõe um dilema que atinge todo o sistema democrático: a banalização do Judiciário e o risco de sua politização midiática. É possível garantir transparência sem transformar o Supremo em reality show? A resposta continua em aberto — mas o desconforto dentro da Corte já não pode ser ignorado.